museu de arte popular

Avatarfechado em Belém mas aberto aqui

Da Arte Popular às culturas populares híbridas

A comunicação apresentada por João Leal no colóquio realizado no passado dia 20 de Julho foi publicado no Le Monde Diplomatique deste mês.

1. Gostaria de apresentar dois argumentos principais em defesa do Museu de Arte Popular (MAP), que o presente governo, mal avisado, decidiu encerrar. O primeiro diz que, num quadro – como o que caracteriza a contemporaneidade – em que tudo se tornou susceptível de patrimonialização, faz todo o sentido encarar o MAP como um património que deve ser defendido ou, para ser mais específico, como um museu que deve ser musealizado. O segundo argumento diz que, num quadro – como o que caracteriza a contemporaneidade – em que as culturas populares têm vindo a ser reformatadas a partir de ideias como a hibridez e a criatividade, faz todo o sentido dinamizar o MAP, fazendo dele uma plataforma de diálogo com essas novas formas da cultura popular. O primeiro argumento extrapola para o caso do MAP ideias sobre o património defendidas por historiadores como Pierre Nora e David Lowenthal. O segundo tira consequências de debates sobre as culturas populares pós-modernas protagonizados por antropólogos como Nestor Garcia Canclini ou David Guss. (...)

Ler o artigo na íntegra no Le Monde Diplomatique de Julho.

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Processo de classificação do edifício do Museu de Arte Popular deverá ser reaberto



Link para o artigo completo no site do jornal Público.
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Boas notícias

Um parecer que propõe a reabertura do processo de classificação do edifício do Museu de Arte Popular foi aprovado por unanimidade pelo Conselho Consultivo do IGESPAR no dia 15 de Julho de 2009 - exactamente um mês depois da entrega formal neste Instituro de um pedido nesse sentido e também, por mera coincidência, no dia do 61º aniversário da inauguração do MAP. O documento emanado do CC tem especialmente em conta o facto de o edifício ser o único que resta da Exposição do Mundo Português e refere "que o mesmo deve ser salvaguardado, e legalmente protegido, nas suas componentes construtivas e de património artístico aí integrado". Por o imóvel se situar em "zona monumental" ele já era objecto de protecção legal, mas - acrescenta o parecer - "propõe-se agora a atribuição de uma classificação enquanto objecto individual".
É uma decisão que vem, sem dúvida, ao encontro das posições de quem pretendeu defender o edifício e o Museu de Arte Popular que aí foi instalado em 1948, quando se introduziram importantes alterações arquitectónicas no anterior Pavilhão da Vida Popular da Exposição do Mundo Português, de 1940, e se dotou o imóvel de um conjunto muito significativo de obras de arte - pinturas murais e baixos-relevos - adaptados a essa sua nova função.

Por outro lado, a reunião anunciada à imprensa pelo Ministro da Cultura no passado dia 17 de Junho com os animadores da luta em defesa do MAP teve lugar esta manhã (estiveram presentes - para além do Ministro e do seu Chefe de Gabinete - Catarina Portas, Joana Vasconcelos, Rosa Pomar, Raquel Henriques da Silva e Alexandre Pomar). Durante a reunião, foi abordada a reabertura pelo IGESPAR do processo de classificação do imóvel do Museu de Arte Popular e as suas imediatas ou eventuais consequências, tendo-se o Ministro declarado aberto a discutir o futuro do edifício e do Museu, mediante formas de auscultação da opinião pública e de ponderação de pareceres especializados que fundamentem as decisões a tomar.
Foram postas em evidência as omissões e os lapsos que existem na própria informação institucional até agora disponível sobre o património decorativo de que o edifício do Museu foi dotado (da autoria dos pintores-decoradores Tomaz de Mello, Carlos Botelho, Paulo Ferreira, Eduardo Anahory, Estrela Faria e Manuel Lapa e do escultor Júlio de Sousa), o qual não se encontra publicado nem devidamente estudado no âmbito da história de arte. Nesse sentido, e também em matéria de apreciação do design do mobiliário expostivo do Museu e, em especial, nas áreas da museologia e da antropologia, foi definido o compromisso de contribuir com informação e pareceres especializados no sentido de aprofundar o debate e fundamentar a defesa da preservação e renovação do antigo MAP, estimulando assim o alargamento da discussão pública do assunto. Por sugestão do Ministro da Cultura, o "site" oficial do Ministério poderá vir a acolher, sob formas a decidir, a documentação já reunida e ainda a produzir sobre os temas do edifício e do Museu, procurando-se explorar as virtualidades das novas tecnologias da informação para estabelecer redes de debate e de auscultação e troca de opiniões.
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Joaquim Pais de Brito: "Está tudo preparado para voltar a casa"



Excertos do artigo de Ana Machado no Público de hoje (ver artigo completo):
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Noutra ala das reservas do Museu de Etnologia estão os têxteis. "Eram a parte do espólio mais bem tratada e catalogada." São dezenas de pequenas gavetinhas metálicas com paninhos alvos bordados, envoltos em papel de seda. E armários, que se estendem por todo o comprimento da sala, fechados, que escondem trajes tradicionais, roupas de cama e casa e peças de maior porte.

"Fiz questão que fossem todas marcadas. Está tudo preparado para voltar a casa. Ou para servir o fim que o ministro indicar", diz o director [Joaquim Pais de Brito].

"Ainda falta arrumar a colecção de ex-votos e objectos ligados à vida religiosa", lembra Pais de Brito. "Hoje sabe-se mais sobre o Museu de Arte Popular do que alguma vez se soube."

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Raquel Henriques da Silva, historiadora de arte e ex-directora do Instituto Português de Museus (actual Instituto dos Museus e da Conservação), um dos nomes mais destacados da luta em defesa do Museu de Arte Popular, frisa a importância do espólio da instituição: "Tem colecções muito importantes e reflecte a visão da cultura popular. E temos uma nova geração interessada nesta área da cultura quer em termos de trabalho quer em termos expositivos", defende a especialista, para quem só no espaço para que foi criado, junto ao Tejo, o Museu de Arte Popular faz sentido. A investigadora é uma das mentoras da petição que defende a classificação do edifício e a manutenção do espólio no lugar de origem, já entregue ao ministro da Cultura.

"Estamos perante uma obra que funciona como um todo. A nível de construção e desenho encerra um tipo de arquitectura praticada pelo Estado Novo. Constitui um documento único para a investigação contemporânea sobre a política do Estado Novo", diz ainda Maria Barthez. A investigadora lembra que nem na ditadura este museu foi amado.

"O museu já era mal-amado no Estado Novo. Nos anos 50 já tinham de fazer obras e já não havia dinheiro nessa altura. Foi sempre um museu inacabado. E mesmo assim era o museu mais visitado na década de 1960 a seguir ao dos coches." Nos últimos anos de existência, antes de fechar as portas, o museu recebia anualmente cerca de 32 mil visitas.

Maria Barthez alerta para o futuro da arte popular: "As pessoas não conhecem o que é a arte popular e o que se está a perder com o fim dos artesãos. Somo um país pequeno, com tanta identidade e variedade. Devíamos estimar mais isso."

Mas para Pais de Brito a relação com o Estado Novo é a principal razão pela qual o debate em torno do encerramento do Museu de Arte Popular não colhe mais apoio. Apesar de frisar que os problemas que afectavam a instituição eram muitos. "Acho pouco consistente esta forma súbita de querer pôr trancas à porta quando a porta já foi arrombada há tanto tempo. O problema do Museu de Arte Popular não é de agora. Mas parece que todos estavam satisfeitos." E questionado sobre se seria possível reinventar hoje o Museu de Arte Popular, Pais de Brito responde: "Não me posso pronunciar, já que esse debate não foi aberto."

Alguns dos trabalhos de restauro do espólio do Museu de Arte Popular podem ser acompanhados no blog do Museu Nacional de Etnologia.
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O mobiliário do Museu de Arte Popular

Quanto ao Mobiliário Expositivo, a sua autoria é, na sua maior parte, de Jorge Segurado e Tomás de Mello (Tom). Inspirado nas nossas proveniências regionais, nele está patente uma arte portuguesa, simultaneamente moderna e tradicionalista. Neste contexto, encontra semelhanças com o mobiliário utilizado à época, nas pousadas criadas por Ferro, esse “mobiliário rústico português” de linhas sóbrias e simples (madeira de pinho, encerado de escuro, castanho do Minho de 1ª qualidade, pontuado por aplicações de ferro forjado).

Na sua concepção e criação, houve a preocupação de se estabelecer um elo de ligação entre as diferentes estruturas presentes e elementos de suporte, o que dá essa imagem coerente de conjunto e unidade, propositadamente bem conseguida. Para tal, os seus designers recorrem ao uso de elementos fixos e decorativos como a malheta (muito comum à época), entalhes rústicos de ferro forjado (presente em determinado tipo de mobiliário). Quanto aos materiais utilizados, foram escolhidos para a sua concepção materiais nacionais – madeira castanho, pinho, também folheado a castanho, complementados por vidros (de 1ª qualidade), que fornecem uma completa visibilidade dos objectos expostos no interior das vitrinas.

Destacam-se entre o mobiliário expositivo: vitrinas murais, vitrinas centrais, vitrinas estantes, estantes, cavalete, de sela, entre outros.

O material concebido em exclusivo para o Museu representa a existência de um conjunto único do mobiliário expositivo museológico português.

Excerto da comunicação apresentada por Maria Barthez - "O Culminar da Política do Espírito, de António Ferro" - no Symposium on Portuguese Traditions (Europe, America, Africa, Asia) April 18-19 2009 University of California, Los Angeles







Imagens do Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa
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MAP em destaque no Sol desta semana


Artigo de José Cabrita Saraiva (pp. 42-43).


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A Arquitectura do Museu de Arte Popular - significado histórico

Texto do arquitecto José Manuel Fernandes publicado com o título "Olhar para o Lado" em 4-11-2006, no Expresso.


Pavilhão da Vida Popular. Fotografia de Mário Novais, 1940.
O “restante” Museu de Arte Popular / MAP, com o seu edificio de característica fachada classicizante e simétrica, nasceu com e para a famosa Exposição do Mundo Português de 1940, sendo então parte integrante de um vasto conjunto pavilhonar. Não se adivinhava na época, para aquelas construções “efémeras” com estrutura de metal e armações de madeira e gesso, uma vida tão longa como são mais de seis décadas...

Se consultarmos o “Programa Oficial / Comemorações Centenárias / 1940”, lá vem identificada, na planta geral da exposição, a mole inconfundível do edifício cujo encerramento agora causa polémica, situado a poente do actual ( e também sobrevivente) “Espelho de Água”, como um dos núcleos do chamado “Centro Regional” - tendo as “Aldeias Portuguesas” do seu lado norte, com a linha férrea e a Avenida da India a separá-las, mas ligadas ambas por uma ponte pedonal (como agora se pretende construir, para ligar a mesma área ao CCB, que entretanto se substituiu às ditas aldeias...).

O grandioso edifício constituía-se como uma das “secções” da mostra (como então se designavam): era a “Secção da Vida Popular”, que se exibia como um repositório de materiais e práticas etnográficas desta mesma “vida” – e que foi naturalmente transformado depois do encerramento do certame em Museu de Arte Popular...claro que sempre na visão folclorista que o Estado Novo detinha sobre a dita.

Se folhearmos o esplêndido catálogo “Mário Novais / Exposição do Mundo Português 1940” (Fundação Calouste Gulbenkian. 1998), podemos apreciar a imagem do edifício que o valoroso fotógrafo registou: é a foto 4, identificada como sendo do “Pavilhão das Artes e Indústrias e Espelho de Água / Secção da Vida Popular”. Trata-se de uma fotografia nocturna, em que a iluminação rasante valoriza as texturas e decorações da fachada pavilhonar, exibindo claros motivos vernáculos, como a telha, as peças cerâmicas, etc.

Diz-nos Rui Santos que a obra foi da autoria do arquitecto Jorge Segurado (que também deve ter projectado as “Aldeias Portuguesas” do outro lado da linha), e contou, como em muitos outros pavilhões, com a participação de diversos artistas plásticos, neste caso Tomás de Melo (Tom), Estrela Faria, Manuel Lapa, Eduardo Anahory, Carlos Botelho e Paulo Ferreira: afinal, dos mais notáveis pintores, ilustradores, decoradores, designers do seu tempo. E Jorge Segurado, se aqui executou uma construção de sentido complementar (se compararmos com os mais majestosos pavilhões da Praça do Império, por Cottinelli Telmo e Cristino da Silva), é o autor do mais importante e ímpar edifício do modernismo português, a fortíssima e aparentemente duradoura Casa da Moeda, ao Arco do Cego, em Lisboa...

Ainda recordo aquele espaço, nas minhas visitas de estudo escolares, em que participei no tempo da Instrução Primária, algures por 1959-60 – e nessa época o Museu impressionava, com o seu cheiro às mais diversas matérias orgânicas, vegetais (já algo mofentas), e com os manequins, trajados a rigor, convivendo com os mil objectos de um mundo rural ou aldeão que ignorávamos... Apesar de tudo, como museu informativo e visão coerente de pedagogia, era uma utilidade que ainda se recomendava.

Depois, nas décadas de 1970-90, foi o acentuar da decadência, com a respectiva falta de investimento, associada a (e provocada) por uma espécie de “olhar para o outro lado” que o pensar no tempo histórico do Estado Novo desencadeou (e ainda desencadeia, pelos vistos) em muitos dos nossos concidadãos, e que tem como consequência a depredação ou desaparecimento fatal de muitos documentos com valor histórico. É que, quer se queira quer não, o período salazarista correspondeu a cerca de metade do atribulado século XX português – e por isso, para alguma coisa há-de servir estudá-lo e conhecê-lo, sem complexos esquerdistas mas também sem preconceitos e ênfases direitistas – apenas como ele já é, para a maioria jovem da nossa comunidade – um tempo antigo, dos avós, que provoca alguma curiosidade pela sua aventurosa sequência de factos...

Há alguns anos, foi necessário, aparentemente in extremis, envolver o edifício do museu por uma estrutura de suporte de uma cobertura provisória, e o seu encerramento foi inevitável, aguardando por melhores dias. Não é compreensível, à luz do nosso contexto cultural de hoje, nem que se “deite fora”, ou reinstale algures o espólio deste objecto construído, nem que se faça outra coisa em lugar do que lá está. As razões para isso, já do conhecimento público na sua maioria, são essencialmente estas:

1 – o significado histórico do edifício, no contexto do lugar (é indissociável do “Espelho de Água”, do monumento aos Descobrimentos, das esplanadas envolventes) e da sua função (o olhar classificador e paternalista do Estado Novo, colocando a Cultura e Arte Populares “a seguir” à História e à Arte Erudita, na hierarquia da Expo 1940);

2 – a importância arquitectónica do edifício, que é hoje um “facto singular” e quase isolado no quadro das edificações sobreviventes, intactas ou quase, da Expo 1940 – raridade na sua solução construtiva, utilizando ferro, madeira e gesso, raridade na sua dimensão estética, porcurando conjugar o desenho modernista e geométrico com a forma mais clássica, representativa e neo-historicista – muito “à maneira” de 1940;

Esperemos que o bom senso prevaleça, gerando um futuro MAP competentemente recuperado e de nova aberto ao público!

José Manuel Fernandes arq
30/10/2006


Núcleo das Aldeias Portuguesas e Pavilhão da Vida Popular. Fotografia de Mário Novais, 1940.
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Depois do colóquio

No Colóquio sobre o Museu de Arte Popular que ocorreu no último Sábado, dia 21 de Junho, debateram-se várias ideias sobre o futuro do MAP. Essas ideias não nasceram de uma inspiração repentina; foram amadurecidas a partir de investigações sobre o museu e a política cultural do SNI e nascem de um olhar aprofundado sobre a história da arte em Portugal, por um lado, e de uma análise antropológica sobre os diálogos entre o popular e o erudito por outro.

Como explicou Alexandre Pomar, reabrir o museu não é devolvê-lo à morte lenta em que se encontrava. Uma das ideias que está em cima da mesa – a entrecruzar com vias de revitalização paralelas -- é usar o que foi feito na época para pensar os modos de apropriação da cultura popular por parte do SNI e confrontar os visitantes do Museu com esse contexto. Qualquer colecção, criada hoje ou há um século, nasce de um ponto de vista. O Museu de Arte Popular -- porque nele a colecção e o edifício foram pensados em conjunto -- oferece-se como estrutura museológica única para pensar as modalidades de selecção e reinvenção da cultura popular na primeira metade do século XX em Portugal. E, a partir desse quadro, reflectir sobre as aproximações intelectuais e políticas à arte popular desde finais do século XIX até à actualidade, aspecto que poderia ser explorado através de exposições temporárias regulares.

No que diz respeito à política folclorista promovida por Ferro, deve acentuar-se que a colaboração dos artistas modernos nas acções de carácter etnográfico do SNI, de que o MAP é testemunho, não é arbitrária. Ao contrário do que normalmente se pensa, a aposta do SNI na arte popular não pretende apenas testemunhar uma identidade assente em costumes remotos e imemoriais. O que interessa a António Ferro é a afirmação de Portugal no tempo presente; a arte popular, remetendo para a vivência contemporânea das tradições, teria essa vantagem em relação ao culto das glórias do passado: falaria de uma nação plena de vitalidade que não vivia apenas da grandeza pretérita. No contexto da intervenção do SNI, a etnografia aparece, pois, como alternativa à celebração da história.

Ao colocar o arranjo expositivo do Museu de Arte Popular e, anteriormente, do Centro Regional da Exposição do Mundo Português, nas mãos da equipa de pintores decoradores do SNI, António Ferro impedia precisamente que a arte popular fosse um mero sucedâneo do culto das antiguidades históricas. Neste sentido a reunião dos objectos de arte popular que fazem a colecção do Museu e o edifício em que os mesmos foram expostos são o reflexo de duas dimensões, profundamente interligadas de uma mesma política. Separá-los, relegando os objectos exibidos no MAP para outro espaço, prejudicaria profundamente a capacidade de compreensão da lógica que esteve subjacente à criação daquela colecção.

Vera Marques Alves, Antropóloga


Vista do Centro Regional (Exposição do Mundo Português de 1940, Pavilhão da Vida Popular). Clicar para ampliar.





Fotografias de Cláudia Varejão
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